Dia destes peguei-me em um “first date” com um cara mais velho. Eu, que já tive a minha cota considerável de garotos, achei um tanto quanto revigorante a ideia de sair com um homem com “H” maiúsculo. Revigorante e intimidador, pra dizer o mínimo, claro. Durante o encontro tentei direcionar a nossa conversa para assuntos aleatórios e inofensivos. Papo vai e papo vem entre uma cerveja e outra, e a pergunta latente e implacável surge na conversa:

–Mas afinal, Antônia.O que você espera de um relacionamento? O que você quer?

Fiquei muda, como poucas vezes na vida eu fiquei (logo eu que não pago imposto pra falar demais). E lá eu me calei, por longos minutos sem saber o que dizer. Foi um choque. Naquele momento eu me dei conta que a esta altura do campeonato, eu não tinha a menor ideia do que eu queria. Mas já não tinha a menor dúvida das coisas que eu não queria.

Sabe o que eu não quero? Eu não quero ter azia de ciúmes. Sabe aquela queimação no estômago, justificada ou não, por conta de um sentimento de perda ou ciúmes compulsivo? Não quero. Nem por um minuto. A “sorte de um amor tranquilo”, como o de Cazuza, nada de chiliques.

Também não quero pressa ou pressão, ou alguém me prendendo à força – deixe-me livre e verás que não irei a lugar nenhum, tente me prender na marra, e serei a primeira a pular fora mesmo sem paraquedas. Não quero ficar que não seja por escolha própria. E também não quero ter que pedir carinho. Carinho se entrega de graça. Beijos são tascados ou roubados, jamais solicitados. E não quero sair da cama sem cafuné. Aliás, eu me nego a sair da cama dividida sem cafuné.

Não quero perfil de rede social compartilhado. Não quero a sua senha do celular. Não quero me importar com aquela sua ex que curte todas as tuas fotos no Instagram. Aliás, também não quero falar de ex, nem das suas, nem dos meus – eles já fizeram a contribuição deles ensinando tudo que eu não quero mais. Não quero achar ruim que você joga futebol/peteca/ hockey/pedrinha n’água toda quarta-feira. Não quero conta conjunta.

Não quero que você diga que eu não arrumo os potes da cozinha como a sua mãe. Aliás, não quero e nem vou competir com a sua mãe. E nem imagine que você poderá falar qualquer coisa da minha. Não quero que você troque o pneu do meu carro, e nem fique chateado quando por vezes eu precisar provar pra minha própria teimosia que eu preciso aprender a pedir ajuda. Não quero alguém que largue a minha mão quando a coisa ficar feia. Ou quando eu ficar feia.

Não quero ser responsável pelas suas roupas, mas não me importo de jogar suas cuecas na máquina de vez em quando. E também não quero comentários a respeito da minha toalha molhada sobre a cama, mas confesso que posso me apaixonar se te pegar recolhendo-a, ainda que contrariado. Não quero deixar de ser botequeira (= leia corretamente), e não vou ser uma lady por ninguém. Mas se me disseres que eu fico linda naquele vestido arrumadinho que você me deu, não vou deixar de usá-lo me esforçando para não estragar o cetim de alta costura pulando de uma cama elástica (história verídica).

Não quero e nem vou pedir desculpas pelas minhas celulites, e não vou me importar com sua pancinha de chopp. Não quero que você diga “eu te amo também”, só pra tranquilizar meu ego, pois eu já não sou mais tão imatura, e posso esperar você ter vontade de dizer quando estiveres pronto. Não quero que você deixe de sair com seus amigos, não vou deixar de sair com as minhas amigas, não vou abrir mão de termos amigos em comum. Não quero que você corrija seus defeitos ou calibre seus excessos por mim, pois eu também prefiro tomar estas atitudes por vontade própria. Não quero que você invente desculpas, por você ou por mim. Não quero que você se apaixone por alguém que eu “possa ser”, ao invés de amar quem eu realmente sou.

Não quero passar um final de tarde na praia sem você. Não quero que você deixe de dançar comigo porque tem vergonha. Não quero me perder por aí quando a gente brigar. Não quero me esquecer de quem eu sou e amo ser.

Hoje eu entendi finalmente que precisava estabelecer todos os meus nãos, antes de aceitar os sins. Fui calibrando minha expectativa de um romance duradouro por eliminatória. Um solavanco de um aqui, uma pressão do outro ali, um “nem te ligo” acolá. Hoje todos os sinais vermelhos aparecem quando eu detecto o que eu não quero. Até o dia em que chegar a exceção à regra, onde todos os meus nãos serão facilmente substituídos por um único sim.

“Pode falar, Antônia. O que você quer?” – perguntou novamente o homem de “H” maiúsculo, me retirando da minha autoanalise.

Dei um longo suspiro de quem correu uma maratona interna no assunto antes de responder:

“Eu ainda não sei o que eu quero. Mas sei o suficiente para desviar do que eu não quero.E tenho o coração aberto para dia desses, reconhecer quando encontrar o que procuro. Disso, eu não tenho dúvidas.”








Uma questionadora fervorosa das regras da vida. Viajante viciada em processo de recuperação. Entusiasta da escrita. Uma garota no divã figurado e literal. Autora do blog antonianodiva.com.br.