Quando comecei a fazer análise aos 19 anos, não imaginava o gatilho que eu dispararia.
Não mesmo. E mais, não imaginava que ele nunca mais haveria de desengatilhar.

Como todo mundo, ou quase a maioria, meu encaminhamento pra análise aconteceu em meio a uma pergunta : por que as coisas são como estão me parecendo?

Lembro que, na época, estava noiva mas sabia que havia algo de equivocado naquela escolha. Não me parecia ser uma ideia formada, conceitual, absolutamente tranquila para alguém que, teoricamente, passaria a vida inteira com uma escolha.

E não era uma escolha. Era apenas uma provocação. Da vida. Minha.
Ainda não sei, mas, provavelmente de nós duas em concurso de crimes dolosos contra à felicidade, sujeito ao agravamento de pena pelo número de agentes, modo da conduta e motivo torpe, para atacarmos uma só pessoa : eu mesma. Crimesinho vagabundo, de modus operandi conhecido, mas que a humanidade comete, e comete, e comete…

Ninguém vai precisar ler minha biografia um dia para saber que não casei com o moçoilo (sorte de ambos) e me pus a acabar com a cerimônia toda (quase tudo pago) e esses preparativos, que mais das vezes servem para dar de presente às famílias a satisfação do comando de voz da vida de alguém que, propriamente, para sedimentar entre as pessoas a sua escolha, uma pela outra, livre de muitas perguntas e atestados de bom comportamento.

E mais uma vez, vinte anos depois, me faço a mesma pergunta : por que as coisas são como estão me parecendo?

Porque ainda hoje se recorta a imagem da família equacionada aos padrões internacionais de bom comportamento (ironia pura), para se desrespeitar o que se sente ou quando se deixa de sentir amor por alguém.

Algumas pessoas dirão que não, mas notem como se comporta a amiga casada diante da recém-separada. Parece que está em confronto com um ser intergaláctico.

Fico pensando a quem essas mulheres querem confrontar usando tanto as imagens de seus pares, ou melhor, por que ainda não se sentem seguras das suas escolhas?

Ou, talvez o que seja ainda mais grave : por que não se sentem seguras de terem sido escolhidas?

Santa Psicanálise. Comecei falando de um santo e acabei desembocando noutro.
Poderia escrever agora a seguinte crônica : INFELIZ, MAS CASADA.

Mas essa fica pra próxima. Prometo. Pensemos nela.

Santa Psicanálise!








Cláudia Dornelles. Escritora, autora de três livros publicados de crônicas, advogada e administradora da página Alma No Varal.