Autora : Dra Érika Stancolovich

A biologia defende o ponto de vista de que cada ser humano é dotado de um potencial genético que faz com que ele seja mais resistente que outros.

A psicologia vê a importância do relacionamento com a família, principalmente na infância, que vai construir a capacidade de suportar crises.

A sociologia diz que a influência da cultura, das tradições é que é
importante.

A teologia vê a necessidade do sofrimento como fator de evolução espiritual: “o dar a outra face”.

Independente da explicação, o que devemos considerar é que existe o grupo daqueles que conseguem retomar a vida mesmo com o que podemos até classificar como tragédias, como a perda de um filho, uma amputação, graves doenças físicas ou psíquicas. E o grupo daqueles que nem mesmo possuem iniciativa para
tentar, o que dirá retomar algo.

Quando se trata do comportamento humano, a palavra resiliência significa a habilidade de lidar e superar adversidades, transformando experiências negativas em aprendizado e oportunidade de mudança. Ou seja, “dar a volta por cima”.

Quantas pessoas você conhece que passaram por traumas, tragédias, experiências ruins e conseguiram se restabelecer? O que elas têm de diferente?

Razões podem existir diversas, mas com certeza essas pessoas souberam resgatar a “força interior” e utilizaram a resiliência para superar a crise. A palavra “se”
não existe em seus vocabulários, mas sim a capacidade de elaborar respostas
positivas e eficazes, a fim de enfrentarem traumas, perdas, transformações, rupturas e desafios.

Se a sua habilidade de resiliência ainda não está 100% desenvolvida, não se
preocupe, sempre é tempo de estudar e aprimorar. Uma postura resiliente enxerga
as situações com mais clareza e tem discernimento para classificá-las, separando
problemas de questões triviais, que apenas dependem de uma decisão “comum”.
Tudo é questão de escolha, e todos temos direito de fazer nossas próprias escolhas. Nem sempre acertamos, mas isso não significa que erramos ou que devemos

colocar em dúvida nossa capacidade. As dúvidas, a hesitação e o frio na barriga
fazem parte da tomada de decisão, e que somados à resiliência que carregamos
nos tornam fortes e assertivos.

Lembro-me como se fosse hoje. Marcela, casada, trabalhadora, mãe de três fi-
lhos e superpositiva. Eu a conheci na faculdade, ela lecionava Linguística. Muito
extrovertida, uma ótima companhia nos intervalos para um papo agradável e des-
contraído. Certo dia, ela entrou na sala dos professores chorando, agitada, trans-
tornada, nem de longe se parecia com a Marcela dos intervalos. Prontamente fui
até ela e ofereci meu apoio, ela quis desabafar.

Disse-me que sua vida era boa, ou pelo menos até então ela assim a considerava. Tinha saúde, família, emprego, lazer, enfim, tudo o que uma pessoa basicamente precisa para estar feliz. Mas, ela tinha descoberto que o marido a traía, e
essa notícia abalou o seu mundo. Seu primeiro pensamento foi matar a amante,
depois o marido, e depois cometer suicídio. Com essa afirmação sem dúvida alguma ela se encontrava em uma situação de risco, apresentando sintomas psicossomáticos visíveis como sudorese e delírio. Ela só desejava fazer “justiça”, não
conseguia literalmente pensar em mais nada.

Diante daquele quadro, deixei-a na sala de professores, tranquei a porta e pro-
curei a direção da faculdade. Sem entrar em detalhes, mencionei que a Marcela
não estava se sentindo bem e que precisava ser levada ao hospital. Saindo da
faculdade fomos ao pronto-socorro. Sua pressão estava muito baixa e ela foi medi-
cada. Ela não desejava voltar para casa naquele momento, então avisamos sua
filha que ela não dormiria em casa naquela noite, que estava em minha casa e que
estava bem.

Em minha casa a ouvi com muita atenção, deixando-a desabafar e chorar, não
era o momento de intervir. Cansada e também afetada pela medicação, ela adormeceu. No dia seguinte quando acordou, após um banho e café, fiz minha primeira aproximação. Eu precisava saber o que ela sentia e no que estava pensando.

Mediei sua reflexão, suas emoções e seu entendimento daquela situação buscando
o melhor equilíbrio possível.

A situação é desagradável, constrangedora, e acredito que ninguém se prepara
ou já tenha respostas para enfrentar uma traição. Por isso a resiliência em um mo-
mento como esse é ainda mais primordial, pois evita que emoções e pensamentos
desordenados gerem atitudes precipitadas e até por se dizer desastrosas.

Com a Marcela realizei um trabalho de terapia e de coaching, levando-a para uma
reflexão resiliente, de forma que mesmo sofrendo, ela conseguisse avaliar o que
era bom, o que era ruim em sua relação com o marido, o que ela pretendia para o
futuro e quais eram seus sentimentos independentemente do que tenha acontecido. Essa reflexão era fundamental para uma melhor tomada de decisão, fosse
ela de perdoar ou separar.

Não é questão de ser frio, mas de buscar serenidade e entendimento num ambi-
ente que não é favorável a isso. Com raiva, mágoa, e pensamentos de homicídio e
suicídio, com certeza o resultado não seria favorável para ninguém.

Marcela voltou para casa, conversou com o marido, juntos discutiram a relação
e ela tomou a decisão de perdoá-lo. Se a decisão de Marcela foi acertada, se ela
deveria ou não ter perdoado seu marido, não cabe a nós julgar.

O importante nesse relato foi primeiro a sua atitude em entender que naquele momento de crise ela precisava de ajuda, segundo, ter aceitado receber o tratamento necessário para
que ela pudesse expandir seus horizontes quanto ao que avaliar e terceiro, ter sido
resiliente enfrentando a situação e realizando as escolhas que faziam sentido para
a sua vida.

“Não poderás ajudar aos homens de maneira permanente se fizeres por eles aquilo que eles podem e devem fazer por si próprios.”
Abraham Lincoln

Poderia citar vários outros nomes de famosos resilientes, mas meu objetivo é
maior do que mostrá-los a você e fazer você se identificar com eles. Meu objetivo é
fazer você refletir que a mudança que você tem que fazer na sua vida começa por
você.

Olhe ao seu redor, procure conhecer histórias de pessoas do seu convívio
social que são resilientes, observe e as use como exemplos, se preciso. O que é
bom e funciona deve ser copiado, não existe vergonha em seguir moldes que valham a pena. Eis outra coisa que desejo a você: que saiba enxergar com a alma –

“Só se vê bem com o coração e o essencial é invisível para os olhos”, do livro O
Pequeno Príncipe.

Seja grato às adversidades, obstáculos, conflitos que aparecem em sua vida,
pois eles nos ensinam a nos tornar pessoas melhores, nos ensinam a exercer a
tolerância, a compaixão, o autocontrole, a humildade, e com isso a resiliência.
Esses confrontos nos tornam fortes, nos lapidam, para que a nossa “luz interior”
brilhe.

Texto extraído do livro: Resiliência

Autora : Dra Érika Stancolovich