A grama verde do nosso vizinho sempre foi motivo de curiosidade e certa inveja. Mas a questão é: O quanto cuidamos de nosso próprio jardim ao invés de analisarmos minuciosamente a cor da grama de quem mora ao lado?

O mesmo dilema se repete por diversas vezes, advindo de bocas diferentes, de perfis opostos, mas ainda assim a grama do vizinho é sempre mais verde do que a nossa. Pergunto me o que ele usaria todas as manhãs para adubar sua terra. De uma coisa eu puder perceber, ele não usa o pó mágico de Peter Pan, nem tão pouco suas sementes são de ouro.

Vivemos em uma era onde o céu deixou de ser o limite, buscamos cada vez mais o poder, o status e posição social que traga benefícios perante nossos amigos na rede social. A busca se limita por alterar o status de relacionamento, pelo check in no melhor restaurante, pela melhor foto, onde nela haja uma valorização de cada detalhe de seu corpo. E nessa busca desenfreada pela aceitação social e pelo reconhecimento alheio, pego a mim mesma, e outras diversas amigas, em tardes de domingo sentadas na janela observando a grama do vizinho, e se questionando novamente, como ele consegue? Afinal sua vida é aparentemente tão monótona.

É justamente quando paramos para observar que damos a chance, implicitamente, de ouvir a voz da alma. Ela não nos exige um figurino adequado, marcas ou rótulos de aceitação. O que a alma pede, e grita é por liberdade.

Recentemente, e acuso dizer que por uma raridade do destino, deparei-me com um membro de minha rede social, e por ironia da vida, aquele cuja grama, aos meus olhos, sempre foram verde. De frente a uma oportunidade única, não hesitei em questioná-lo sobre o adubo que há tempos fazia uso. A resposta foi tão simples, que por certo momento houve em mim uma angústia, como as das tardes de domingo, onde o silêncio pairou em minha vida. “Eu não faço planos, eu apenas permito que a vida faça seus planos em mim”.

Demorei um pouco para fazer a digestão, porém a reflexão veio concidentemente na tarde do dia seguinte, que era um domingo. Somos culpados por dedicar mais tempo a observar, analisar e até mesmo julgar a grama e modo como o vizinho conduz suas escolhas, do que cuidando de nosso próprio jardim.

Erro nosso é planejar a melhor pose para a foto que publicaremos no segundo seguinte na rede social, do que nos permitir abraçar os amigos que estão nessa foto. Erro é acreditar que é feliz quem tem mais amigos no facebook; que o histórico de fotos do Instragran é o que resumi nossa vida. Erro nosso é deixar de rever amigos antigos, de esquecer o gosto do beijo e o brilho dos olhos de alguém especial, de deixar o hoje para viver amanhã.

Talvez a grama não necessariamente precise ser verde, ela pode ser da cor que desejarmos, assim como nossos sonhos, como nossos planos e como as nossas escolhas. A diferença estará, na maioria das vezes, no modo como cuidamos daquilo que temos de mais valioso. A minha grama é da cor que eu quiser, por que percebi que há pessoas que nos roubam, e outras que nos devolvem. E assim como os caminhos, a cor da nossa grama nada mais é do que a escolha que fazemos, ou melhor, aquela à qual nos permitimos viver.








Psicóloga clínica e doutoranda pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Bauru. Nas horas vagas é bailarina e está constantemente em busca de novos desafios que a façam feliz.