Conhecimento

EXCESSOS QUE NÃO NOS PREENCHEM…

Sempre me senti isolado nessas reuniões sociais: o excesso de gente impede de ver as pessoas… Mário Quintana

Estamos na era das várias possibilidades, dos milhares de contatos, de caminhos e janelas abertas para informações das mais variadas naturezas e lugares. Acordamos pela manhã e sem que houvéssemos previsto, antes do meio-dia já estamos engajados com uma ideia, um projeto ou uma campanha que aparecem na nossa timeline, talvez até nascida do outro lado do mundo, como um vento que veio de longe e mesmo assim alcança balançar os nossos cabelos. Mas será que toda essa abertura e opções conseguem fazer com que nossa existência esteja mais completa e realmente rica de experiências?

Para quem tem mais de vinte e poucos anos, ainda que engajado e contagiado por tantos acessos a mil e milhares de janelas coloridas e ofuscantes, haverá ainda a lembrança de uma época não tão cibernética. A época em que se compartilhavam poucas fotos, às vezes até fora de foco, com olhos vermelhos, numa tarde entre amigos que apareciam de surpresa em casa porque ninguém atendeu ao telefone e mesmo assim ninguém viu problema em chegar em casa e ficar para a janta. Uma época em que se escreviam cartas para enviar para a madrinha que morava longe. Época em que se esperava por aquele filme passar na TV (havia filmes fantásticos passando na TV) e pelo próximo episódio de uma série que só passaria no sábado que virá.

O que estou tentando destacar não é uma nostalgia que tenta sempre transformar o passado em um paraíso perdido que difere do tempo presente, porque sempre o tempo que se foi parece um pouco, de certo modo, mais completo e com sentido do que as horas que estamos vivendo.

Sim, estamos vivendo hoje, e a cada minuto parece que essa vida passa mais depressa, possui mais acontecimentos, mais experiências, mais eventos para se participar e olhar… Mas o que estou querendo elucidar é que há tanta informação, tanta luz piscando fortemente em nossa direção que já não mais conseguimos aproveitar com tranquilidade um céu estrelado de verão com as mãos vazias.

A cada dia que passa, sentimos a necessidade de mais coisas para nos sentirmos bem, completos. E isso começa com uma simples foto nossa que postamos e verificamos milhares de likes… sim, milhares de likes, de pessoas que estão ali separadas na categoria de amigos mas que esporadicamente você tem um contato de pele e de olhar… e a cada momento, precisamos de mais e mais. Numericamente…. é assim que estamos contanto e avaliando nossas experiências…. Estamos criando necessidades de muitas coisas para nos sentirmos bem. Começa por algo simples como uma foto, como a quantidades de amigos, a quantidade de lugares, de festas, de fotos, de bens materiais, de bocas… e quanto mais vamos acumulando, menos impacto vão causando em nossa sensibilidade. Sim, com tantas janelas a nossa volta, nossa sensibilidade também não desacelera… E de uma indignação para um suspiro fofo não passa nem um minuto… O que estou querendo dizer é que estamos passando muito rápido por tudo, como se nos fosse necessário abarcar o mundo, tudo e todos para termos uma migalha do que realmente somos ao nosso alcance.

Um professor de Literatura, certa vez, no início de sua disciplina da faculdade, falou que iríamos, ao longo do período, ler um romance. Isso mesmo, um romance! Para tentarmos capturar a essência do Romantismo na Literatura. Leríamos apenas um, mas com profundidade, com calma, com um olhar apurado, ao invés de lermos dezenas de obras em poucos meses para acabarmos assimilando pouco e de forma rasa. O objetivo ao final do semestre foi alcançado, porque conseguimos, afinal, dar a nossa atenção por inteiro a alguma coisa e essa atenção nos ensinou muito mais do que qualquer lista enorme de obras que poderiam passar por nossos olhares sem tanto significado.

Acho que precisamos trazer essa lição para a nossa vida cotidiana, para o nosso olhar diante as horas e cores do dia. O que parece é que estamos desenvolvendo em nosso organismo uma necessidade de pressa que faz com que corramos contra o tempo… assim como a tecnologia faz a cada novo exemplar que lança, mais original, mais rápido, mais multifuncional, a nova-super-máquina… Aviso aos navegantes: Não somos máquinas!! Não somos tecnológicos e não vamos resolver nossos excessos como um passe de mágica criando um cartão de memória extra que vá abarcar tudo. E há realmente necessidade de abarcar tudo? Lembro aqueles concursos para ver quem come mais determinado prato… Será que alguém apreciou a comida?

Você se lembra da última vez em que sentiu-se completamente em paz, apreciando uma paisagem, lendo sem pressa alguma coisa, observando uma fotografia e reparando no quanto o seu rosto mudou? Precisamos deixar de tentar abarcar o mundo e tentar estar em todos os lugares e com todos do seus círculos de relacionamento ao mesmo tempo. Porque, simplesmente, talvez, no meio de tanta coisa e de tantas pessoas, a gente acabe perdendo a nós mesmos. E quando notarmos o quanto de vida não sentimos o gosto de verdade, pode ser tarde demais…

 

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