O software que promove encontros funciona numa rapidez que impressiona. E justamente por isso também causa sérios problemas, ainda que não percebidos pela maioria de seus usuários.

Além do inconveniente, de usuários que não dão o “Match” e mesmo assim fazem abordagens pelo Facebook, há os efeitos psicológicos que poucos se dão conta.

Começando pela quantidade de pessoas disponíveis para se conhecer: escolhe-se alguém apenas por uma ou poucas fotos. O senso e percepção sobre uma pessoa passa a ser limitado e superficial. E como a oferta é grande, nos sentimos à vontade ao ignorar uma grande maioria apenas pela sua aparência. Nos tornamos frios e insensíveis ao que somos e ao que os outros são. Aceitamos ser parte de um catálogo virtual que se trata mutuamente, na maioria das vezes, como produtos.

A ciência já comprovou, que o ser humano, diante da possibilidade de escolha, age de maneiras diferentes em relação à quantidade da oferta. Se numa determinada compra alguém tem que escolher um produto entre dois ou três, esses itens serão avaliados e analisados com cautela. Não apenas em sua aparência, mas em todas as características embutidas naquele produto. A partir do momento que a oferta sobe para vinte ou trinta, o senso de escolha torna-se superficial. Os produtos passam a ser observados com menos valor e desdém. A capacidade assertiva da escolha diminui consideravelmente.

Nos Estados Unidos e na Inglaterra, mais de 50% dos divórcios tem sido de casais que se conheceram de maneira virtual. Leia-se: pelo Facebook, mensagens pelo Whatsapp, Tinder, inúmeras fotos, até a dura descoberta em seguida, de que a realidade virtual é bem diferente do que se é de verdade. E bingo: se percebe que nossos requisitos na hora de escolher alguém pela internet ou aplicativos nos tornam seres bem mais errantes.

Além de nos aceitarmos uns aos outros como meros produtos e nos tornarmos experts em escolhas erradas, também corremos o risco de nos tornarmos viciados no aplicativo. Não se engane! Isto é uma realidade cruel. A eficácia em conhecer pessoas aparentemente interessantes gera uma ansiedade tão grande sobre a possível satisfação do conhecer alguém sempre melhor que a anterior, que a busca por encontrar alguém especial dá lugar ao conhecer uma pessoa atrás da outra.

Estamos dando preferência e mais validade à algumas dezenas de fotografias rapidamente visualizadas, do que ao verdadeiro conhecer alguém, que vai do longo bate-papo, da avaliação do caráter, personalidade, características como humor e gostos pessoais. Mais valem trinta fotos em trinta segundos do que uma conversa olhos nos olhos, com leitura corporal e oportunidades reais de percepção e descoberta de afinidades.

Estamos nos tornando rasos demais.
Não por acaso, alguns tem abolido o aplicativo. Não por falta de funcionalidade, mas devido ao “em que” seus usuários estão se transformando. Os depoimentos de pessoas conhecidas também não deixam dúvidas. Já ouvi frases do tipo: “para mim é um esporte”, “me sinto viciado” e por aí vai. Além da enorme lista que muitos usuários deixam para trás, de pessoas que conheceram superficialmente e descartaram em seguida.

O aplicativo é tão eficiente que até gente famosa tem se utilizado do serviço. Na prática, acredito que funciona muito bem para encontros rápidos e por vezes únicos. Para quem não se importa com a superficialidade que corre o risco de ser tratado e nas chances de se transformar em alguém que irá buscar uma pessoa atrás da outra de forma compulsiva, é um aplicativo e tanto. Em outras palavras também vale dizer: se você procura apenas uma transa, há uma grande chance de ser por aí.

Para quem espera o encontro de alguém especial, que olha para o ser humano como tal e torce para uma relação duradoura, penso que é uma armadilha da vida moderna. Num efeito social frustrante, podemos nos pegar conhecendo uma pessoa atrás da outra, abrindo nossos corações e repetindo os primeiros encontros algumas dezenas de vezes, gerando uma dor e sensação de fracasso ainda maior do que seria em encontros reais.

Creio que o Tinder pode ser comparado a uma droga muito eficiente, que vicia alguns e outros não, mas que ao invés de prejudicar o corpo e a saúde, deteriora o caráter e a sensibilidade.








Brasileira, 41 anos, formada em Tecnologia em Processamento de Dados, pós-graduada em Gestão Estratégica de Pessoas. Atua numa multinacional na área administrativa como profissão. Escritora, colunista e roteirista por paixão. Poliglota. Autora de doze livros publicados de forma independente pelo Amazon, além de quatro roteiros para filme registrados na Biblioteca Nacional. Colunista no próprio site www.carolinavilanova.com e vários outros. Youtuber no canal Carolina Vila Nova, que tem como objetivo divulgar e falar sobre as matérias do próprio site.