Semana 1 – Hora de sofrer tudo que você tem pra sofrer Uma vontade de ficar deitada na cama (de preferência, no escuro) percorre meu corpo todo. Só quero chorar, porque a vida parece inútil. Nada faz sentido mais. Drama, drama, drama. Nesta semana eu vou me permitir sentir tristeza. Eu mereço passar por esse luto. Minhas amigas me chamam pra sair, mas eu não quero. Não quero fazer nada. Só tem gente idiota na rua, não quero conhecer ninguém novo. Ninguém é como ele. Nunca mais vou amar. Eu odeio o amor.

Chega uma amiga em casa falando que eu não posso ficar assim. Ele não me merece. Ninguém me merece. Eu sou um trapo. Até que ela fala uma coisa que ninguém mais me falou. Essa é a hora de curtir minha bad. Ficar no fundo do poço mesmo. Nenhum sentimento se desperdiça, nem mesmo os piores. Sofre, mas você tem uma semana pra lavar esse rosto e sair pra ver o dia lindo que faz lá fora. Choro de novo.

Passo uma semana sem forças. Produção no trabalho cai pra 0. Não posso ser demitida por causa de homem. Não posso. Preciso sair pra tomar uma cerveja.

Saio. Minha amiga leva uma amiga do trabalho. Passo a noite inteira falando sobre como a gente se conheceu e como é inacreditável a gente ter acabado. Todo mundo falava que a gente combinava. Eu realmente achava que a gente ia se casar. Todo mundo acha isso. É legal querer ficar com alguém pra sempre, mas a gente não precisa apostar todas as fichas nisso. A gente tem que apostar as fichas em vários partes da vida, pra nunca ficar sem nada.

A amiga da minha amiga tá de saco cheio de me ouvir falar, mas tá sem graça de parar de ouvir. Ela já passou por isso, ela disse. Deve estar achando tudo um drama sem fim. E é mesmo. Mas esse é o meu momento de sofrer. Me-deixa-em-paz.

Semana 2 – Hora de viajar, sair da rotina, mudar a pensamento

Despertador toca e parece que tudo foi um sonho, mas logo todos os pensamentos começam a voltar e tudo vai ficando real. Foi tudo real. Começo a chorar, mas não posso me atrasar de novo pro trabalho. Saí o fim de semana todo, mas um dia voltei pra casa bêbada e chorando, no outro fiquei bêbada de novo e peguei um cara que não tinha nada a ver.

Não. Esse fim de semana eu vou viajar. Eu preciso sair daqui. Ligo pra meus amigos e combinamos de ir pra uma cidade perto. A segunda etapa pra esquecer é viajar. Mesmo que seja ali pra esquina. Mas é preciso passar uns dias fazendo algo que você não fazia antes.

Na viagem parece tudo mais distante. Aquele peso todo já saiu um pouco, apesar da tristeza ainda estar instalada por todos os meus poros. Eu não consigo mais morrer de rir de nada. Até que alguma coisa seja realmente muito engraçada e eu esqueça por um instante tudo isso. Mas o pensando fica me puxando pra baixo. Nessa hora é preciso ter bons amigos que te façam rir de nada.

Um amigo da viagem falou uma coisa que eu não vou me esquecer. Ele disse que o amor só existe com a esperança. Enquanto existe um fio de esperança na gente, não tem como esquecer. Ainda existe uma esperança, no fundo, de que ele vai voltar e eu não quero deixar o sentimento ir embora. Eu queria que ele viesse até aqui dizer que tudo acabou pra sempre, mas eu sou a única que pode fazer isso morrer em mim.

Semana 3 – Hora de fazer atividades novas e se arriscar 

Decidi que não vou mais ficar com ninguém por agora. Porque óbvio que eu sinto falta de sexo, mas toda vez que eu tento me aventurar pra “esquecer”, é só ele que vem na minha mente. Então, esquece. Não dá pra ficar me enganando. Eu não quero mais ninguém. Quando chegar a hora, eu vou saber. Não vai ser forçado. Cansei de gente querendo me apresentar gente. Eu quero ficar em paz. Eu preciso esquecer e forçar a barra só atrapalha tudo, porque eu sempre chego em casa chapada, chorando e querendo comer a geladeira inteira. Depois eu quero dormir. Pra sempre.

Eu decidi dar um ponto final e sei que pra isso eu preciso parar de fazer drama. Mas é tão difícil se acostumar com essa vida vazia. E já que está tão vazia, nessa etapa eu vou aproveitar pra fazer tudo que eu ainda não fiz. Vou entrar numa aula de Francês. Sempre quis aprender Francês. Vai ser bom pra ocupar minha mente. Ou eu podia entrar numa aula de teatro, violão. Eu vou inventar uma vida nova, já que essa tá chata demais. No mesmo dia, faço minha matrícula no Francês e peço indicação de um professor de violão. Será que também dá tempo de fazer aula de pintura?

Ocupo minha cabeça procurando atividades novas pra fazer em vez de assistir mais um episódio de Girls. Durmo com uma faísca de ansiedade se acendendo.

Acordo no outro dia colocando “You get what you give” e aceito essas palavras tipo um presente. I got the music in me. Arrumo a cama, coloco um tênis e saio pra passear pela rua ouvindo as músicas novas que eu baixei. Hoje eu vou sair linda e não quero nem saber. Vou usar batom vermelho de dia, sim.

Começo as atividades novas e me esqueço dele durante o tempo todo em que estou nelas. É engraçado, mas fazer coisas novas ajudam, porque eu nunca fiz nenhuma dessas atividades com ele. Aprender alguma nova me dá vontade de viver cada vez mais, pra aprender cada vez mais e uma onda de felicidade bate, depois de dias sem sentir nada. Descobrir que o sentido da vida é aprender coisas novas. Quero aprender alguma coisa nova todos os dias.

Semana 4 – Hora de encarar o tal grande amor, ou ex grande amor, no caso

Comecei o Francês, mas todo mundo da minha turma é meio esquisito. Eu não me importo, porque descobri que tenho mais facilidade com línguas do que eu imaginava, e meu professor já elogiou duas vezes meu desempenho. Me forço a fazer uma coisa diferente todos os dias. Estou fazendo tudo que eu realmente quero e descobri um prazer imenso em ficar sozinha. Penso no passado, mas tenho pensado muito no futuro, nas coisas que eu quero fazer, no que eu quero investir. Comecei a pesquisar umas bolsas de mestrado fora e uma amiga já topou em ir comigo pra França.

Saio à noite com as meninas pra um show insuportável, mas elas me convencem de ir. Eu sabia que existia chance de eu encontrá-lo por lá. Eu já tava tão bem, não precisava disso. E, claro, ele estava lá.

Nessa etapa é preciso encontrar com ele. É bem provável que você tenha uma recaída, mas você está bem com você, está cheia de planos, cheia de ideias novas. Você não vai passar vexame.

Vejo ele de longe e meu coração começa a acelerar. Finjo que eu não vi ele conversando com uma menina e saio de perto. Minhas amigas perguntam se tá tudo bem e meus olhos enchem de água. Quero sair daqui. Parece que todo o trabalho que eu fiz pra me reerguer, nesta semana, foi em vão. Voltou tudo de novo, como se fosse o primeiro dia.

Bebo mais uma cerveja e sinto meu corpo amolecer. Quero ir falar com ele, quero falar que não quero que ele fique com ela. Mas eu não tenho mais nada a ver com isso. Ele é meu ex. Não é meu amigo, nem meu namorado. Ele é uma pessoa que tinha meu coração, que eu tinha confiança, que eu contava os meus segredos. Mas terminar é arrancar um amigo da sua vida à força e dói pra cacete. Eu preciso te arrancar de mim como se arranca uma erva daninha. Mas morro de medo, porque, se eu te arrancar, talvez eu arranque um pouco de mim também. E é isso. Eu preciso arrancar essa memória de mim, porque quem eu era com você, não existe mais. E agora eu sou uma pessoa que faz francês e toca violão. E eu acordo cedo pra andar pela orla. E a vida também pode ser boa sem você, porque eu sou uma nova eu.

Nossos olhares se cruzam e eu tenho vontade que um buraco se abra diante de mim. Sorrio. Você não esperava que eu sorrisse. Você não esperava que eu estivesse ali, pronta pra outra. E eu vejo que você se surpreende comigo. A gente se aproxima, se cumprimenta dando dois beijinhos. Meu deus, isso é muito estranho. Quero me enrolar no seu peito, sentir sua barba arranhando meu rosto. Seu cheiro de vida medíocre me faz querer parar de respirar. Mas eu só pergunto se está tudo bem. Tudo e você? Como andam as coisas?

Quero dizer que sou uma nova pessoa, que talvez você não me reconhecesse, mas você não percebe nada de muito diferente.

Respondo que está tudo bem.

Vi você numa foto num curso de francês. Tá fazendo aula? Só tem gente estranha naquela turma.

Por que ele andou fuxicando meu Facebook se não quer mais nada comigo? Quero concordar que só tem gente estranha, mas percebo o quão imbecil foi esse comentário. Sem querer, lembro que ele sempre fazia comentários imbecis sobre as coisas, mas eu não queria ver. Quando a gente termina, percebe que o outro nem é tudo aquilo. Talvez o que eu gostasse mais em você, era o jeito que eu me sentia quando eu estava com você. Mas agora eu estou construindo uma nova vida em cima dessa que eu já tenho e não posso recusar. Oi, quero trocar de vida, essa não me serviu bem.

Os pensamentos rasgam minha cabeça por dentro e tenho certeza que ele percebe meu coração quase saindo pela boca. Falo que estou fazendo francês e violão e que a vida anda muito bem obrigada, mas penso “quem é aquela otária que você tá conversando?” Agora preciso encontrar minhas amigas. Tchau.

Você não esperava que fosse cortar a conversa e me olha sem entender, mas finge que tá tudo bem. Encontro minhas amigas e falo que quero embora. Todas desistem da noite por mim, menos uma que já está quase ficando com um carinha. Saio impecável do show. Sem dar vexame, sem beber todas, sem falar merda. Viro a esquina e caio no meio fio de tanto chorar.

As meninas me abraçam e compram uma coxinha com muito catupiry e uma Cola-Cola. Aquele é o melhor gosto que eu já senti. A gente volta pra casa e fica conversando um tempão na cozinha, tentando entender aquela situação toda, até que uma delas me faz a pergunta mais óbvia: mas você que voltar com ele? Eu quase respondi de supetão que claro que sim, mas paro pra pensar na minha vida agora, no que ele me falou e percebo que não. Eu não queria voltar pra minha rotina. Apesar de ainda sentir muita falta da companhia dele e das coisas que a gente fazia, eu prefiro não estar com ele agora. Talvez ele não sei encaixe mais nos meus planos. E não respondo nada.

Semana 5 – Hora de se abrir pra alguém novo 

Minha rotina continua a mesma da semana passada. Tenho aula de violão, Francês e meu trabalho tá parecendo mais legal do que era antes. Tô com uns novos planos. Resolvi que sábado de manhã eu vou fazer stand up na Lagoa. Nunca fiz essas coisas, mas as pessoas que fazem parecem bem felizes ali, então resolvi tentar. Eu podia aprender a surfar, pintar o cabelo de loiro e virar aquelas pessoas que são ratas de praia. Eu gosto dessa visão de mim. Eu posso seguir o caminho que eu quiser e não tenho nada a perder. Não preciso me preocupar em dar satisfação e nem evitar brigas por causa de ciúmes. Namorar é ótimo, mas descobri que a vida também pode ser muito incrível sendo solteira.

***

Esse fim de semana eu fui numa festa na casa de um amigo de um amigo. Agora eu vou pra tudo que me chamam.

Nessa festa, eu fiquei conversando um tempão com um cara que veio do Espirito Santo fazer mestrado aqui. A gente ficou fumando um cigarro na janela e eu nem percebi que se passaram 2 horas enquanto a gente trocava uma ideia sobre tudo. Falei do meu ex, ele falou que também saiu há pouco de um relacionamento e percebo que os dois estão satisfeitos de estarem ali, agora, presenciando as coisas boas da vida. Pela primeira vez, desde que eu terminei, sinto uma vontade inexplicável de beijar outro cara. Aqueles olhos castanhos profundos me engolem e eu só tenho vontade de agarrar ele ali mesmo, na frente de todo mundo. A gente não ficou nesse dia, porque ainda não sei se estou preparada pra me decepcionar de novo, mas eu percebo um interesse da parte dele. A gente troca telefone, Facebook e tudo mais, e combina de se encontrar durante a semana. Estou ansiosa pra encontrar com outro cara e meu ex começa a se transformar em lembrança.

***

No outro dia, saio de casa pensando onde foi que eu errei no relacionamento, de uma forma bem racional mesmo, sem dramas. Queria saber onde eu errei pra não cometer esse erro de novo. Chego à conclusão de que eu errei não começando essa vida nova antes e até a rua aqui de casa parece mais bonita.

Versão completa do texto no De Repente dá Certo

 








Marcela Picanço é atriz, jornalista e gosta de fingir que entende das coisas. É fissurada por pessoas e acredita que nossas histórias são as coisas mais valiosas que temos.