Depois do método dinamarquês Hygge, é a vez de suecos e japoneses darem a conhecer ao mundo as suas dicas para uma vida mais longa e feliz

Comecemos pelo ditado “viver não custa, o que custa é saber viver”. A fórmula para tirar o melhor proveito do tempo passado no planeta Terra interessa a todos. Ocidentais e orientais – ou melhor, nórdicos e japoneses – lançaram mãos à obra e converteram estilos de vida e formas de estar em conceitos simples que todos possam adotar. Os dinamarqueses têm vindo a exportar o Hygge, que se traduz no desfrute de prazeres minimalistas em boa companhia. Como? Trocar dois dedos de conversa, sem pressas, ao lado de alguém de quem se gosta, na esplanada de um café. E, já agora, sem o stresse da tecnologia pelo meio. Apreciar estar em casa, junto de familiares, vizinhos ou “poucos, mas bons” amigos. Divertir-se a fazer um churrasco, tarefas de bricolage ou à volta de um jogo de tabuleiro. A felicidade é um estado de graça momentâneo e não centrado no materialismo.

E que dizer do Lagom, a filosofia de vida sueca, assente em valores como a harmonia, a sustentabilidade e a frugalidade? Em bom português, isto significa viver de acordo com o lema “nem oito nem oitenta”, ou seja, pensar, sentir e comportar-se na dose q.b., do respirar ao comer e beber, passando pelo falar, fazer e estar no momento. Acha difícil? Então é porque não experimentou o ritual do morgondopp, que consiste em banhar-se em água fria ao ar livre, antes mesmo de tomar o café ou o pequeno-almoço. Meta: ficar completamente desperto e com vigor para todo o dia. Surpreendente? Nem por isso. Vendo bem, esta é uma variante do duche sueco 2-em-1, que alterna jatos de água fria e quente: estimula as terminações nervosas e tonifica o corpo, mas ao mesmo tempo reduz a tensão muscular e remove toxinas da pele. As longas caminhadas solitárias no meio da natureza – há a versão noturna e a diurna, e ainda a que pode durar dias e funcionar como um retiro – liberta a mente e promove estados de leveza e restaura a perceção de poder pessoal.

No registo Lagom, simplificar é preciso. “Destralhar”, reduzir o roupeiro a meia dúzia de peças essenciais e ganhar espaço e poupar energia ou custos de lavandaria. E que é que vamos fazer (mais)? Talvez pausar. Ou melhor, praticar a fika. No país que todos conhecem pela marca IKEA, a produtividade é tão essencial como o tempo livre e não faltam estudos internacionais a confirmar o que eles sabem por experiência própria: as pausas contribuem para o bem-estar e a boa disposição, além de contribuírem para melhorar o rendimento. Talvez a companhia seja desejável, mas com parcimónia e… sem ruído, s.f.f. Já basta o que basta, após anos de cultura de frenesim, virtual e material.

ATIVOS E MARATONISTAS
O que não está a dar, no século XXI, e já não estava antes, é andar a correr, trabalhar duramente e morrer de seguida. O sentido da vida passa por dar-lhe um propósito e há muitas maneiras de lá chegar. Se as culturas do Norte da Europa defendem que é preciso colocar um travão no paradigma da sociedade hiperligada e acelerada e sentir os dias em modo de câmara lenta, sozinho ou em boa companhia, já os orientais tendem a manter intacta a marca que melhor os define.

Os japoneses, aos quais tantos se referem como sendo o exemplo da mentalidade zen, têm na utilidade um valor supremo, que confere alegria e significado à existência. Daí que não passem sem exercitar a mente e o corpo, dia após dia, como é próprio dos melhores maratonistas. E levam muito a sério o ritual do chá, bem como a dieta. Nada de atafulhar o estômago, procurar mantê-lo cheio com alimentos saudáveis, até 80%, sensivelmente, e assim manter a saúde, a felicidade e a longevidade. Isto é… o Ikigai. Assim se designa a fórmula nipónica para atingir a plenitude e que tem por referência a vila japonesa de Ogimi, em Okinawa, onde foi batido o recorde de centenários do Guinness. Coincidência ou não, estas propostas para aproveitar o momento e viver melhor assentam em culturas em que o sentido de comunidade está presente e as necessidades básicas no plano material estão asseguradas à partida. O que dizer de nós, portugueses, tendo por base variáveis tão distintas como o clima, a mentalidade 
e as políticas que nos regem?

Olhando com atenção os dados do Inquérito Social Europeu (os mais recentes são de 2014), o nosso país surge abaixo da média no grau de felicidade que sente, contrastando com os nórdicos, que ocupam os primeiros lugares da tabela. O sociólogo e investigador Rui Brites, autor da tese de doutoramento Valores e felicidade no século XXI: um retrato sociológico dos portugueses em comparação europeia (2011), lembra que “não basta ser feliz para ser feliz, é preciso poder”. O professor universitário do Centro de Investigação Estudos de Sociologia do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, acrescenta: “Não é por acaso que na Dinamarca, recorrentemente nos primeiros lugares dos rankings de felicidade, 66% dos inquiridos dizem que o rendimento disponível lhes permite viver confortavelmente e em Portugal são apenas cerca de 8% que o dizem.” Daí que permaneça atual a velha máxima segundo a qual o dinheiro não traz felicidade mas ajuda muito. Ou nem tanto? Os resultados do célebre estudo de economia comportamental divulgado há sete anos pelos prêmio Nobel Angus Deaton e Daniel Kahneman confirmam: ter pouco dinheiro está associado a sofrimento emocional, mas a partir de um rendimento anual de 75 mil dólares (cerca de 63 mil euros), que garanta as necessidades básicas, não se registaram acréscimos na percepção de bem-estar. Paralelamente, começa a contar mais passar tempo com quem se gosta e desfrutar dos tempos de lazer.

David Machado, autor do livro Índice Médio de Felicidade (D. Quixote, 256 págs., €14,90), acredita que a felicidade é um estado interno e uma atitude que se aprende. E como se faz? “Relativizar, gerir prioridades e cultivar o sentimento de esperança ajuda, embora uns tenham mais predisposição que outros para se sentirem de bem com a vida.”

A “fórmula de David” não se mede pelo ter mas pela capacidade de observar e estar grato. Ele explica: “Decidi registar num diário três ou quatro linhas sobre o momento mais feliz do meu dia; após algum tempo, constatei que as notas se resumiam a coisas simples, o espanto a contemplar algo à minha volta, uma breve conversa… foi aí que repensei tudo.”