Liga não. Essas caras de fúria, esses olhos arrogantes fuzilando quem está perto, essa gente que não responde a quem diz “bom dia”, “boa tarde”, “boa noite”, esses carros acelerando no farol vermelho contra as faixas de pedestre, nenhum deles vai mudar se você explodir. Respira, se apruma, segue em frente. Deixa isso lá atrás.

Não, o fato de tomar distância de quem lhe faz mal não torna você pessoa conformista. Faz de você alguém no exercício de sua inteligência e de sua liberdade. Ser livre também é poder largar mão de quando em vez. E eu tenho a impressão de que não se pode mudar um canalha, um esnobe ou um criminoso jogando na cara dele o quanto ele está enganado. Quase sempre, só vai fazê-lo se tornar pior. Melhor se afastar.

Postar-se de pé no meio da rua para frear um ônibus que vem acelerando, e cujo motorista não vai parar no ponto por pura maldade, não vai fazer de você um herói. Vai transformá-lo em suicida. Reagir a um assalto explicando ao ladrão que o que ele deseja fazer é uma sacanagem só vai piorar as coisas. Os mais velhos davam a isso o nome de “murro em ponta de faca”. Não adianta. Melhor é sair da frente do touro, correr até um lugar seguro e pensar com seus botões: “mas por que raio esse touro está tão bravo? E o que tenho eu a ver com isso?”.

Sai de perto e pronto. Tomar distância de quem o desagrada não é covardia, não. É um gesto de coragem. Também não é a solução de todos os males. É só uma estratégia: ao se afastar de quem lhe faz mal, você se aproxima daqueles a quem ainda pode fazer uma coisa boa. Pequenas e importantes atitudes de bondade alimentadas todo dia, a qualquer hora. Gestos simples e boas ações a quem quer que seja. Caminhando, você vai saber quem são essas pessoas e o que fazer de bom a elas.

Sei não, mas eu faço fé que aos poucos, com o trabalho de cada um, a bondade ainda vira moda. Fazer gentilezas por aí será uma febre. Educação, respeito e intenções amorosas invadirão a cultura de massas, e em todo canto deste mundo há de haver alguém fazendo o bem a quem puder, de qualquer jeito. Feito um clássico eternizado a cada nova geração, essa mania de integridade e compaixão, brandura e respeito há de virar tradição entre nós. Então a sanha dos maldosos vai morrer à míngua, aos poucos, até se tornar tão insignificante que na prática deixará de existir. Eu faço fé.

Não vai ser fácil. A vida não é videogame. A gente não escolhe entre os modos easy, medium, hard. A gente encara o que vem. Trabalha, cuida, se esforça, planeja, pratica, cai, levanta, espera, segue. E por mais que a gente aprenda tem sempre um enrosco desconhecido ali na frente, nos obrigando a aprender de novo depois de um ou de um milhão de erros.

Tentemos. Tentemos com teimosia e esforço. Não ajuda fazer drama. É preciso fazer dar certo. É o único jeito. Fazer dar certo o amor, a amizade, a família, a vida. Pôr em prática. Bom dia, boa tarde, boa noite, por favor, obrigado, com licença, pois não, você primeiro! Tem trabalho à espera e um mundo inteiro para fazer dar certo. Mãos à obra!








http://www.revistaletra.com.br/ Jornalista de formação, publicitário de ofício, professor por desafio e escritor por amor à causa.