Um relacionamento sólido precisa de sentimentos muito mais difíceis de cultivar do que o amor. Não acredito no amor romântico. Eu acredito no amor. Acredito muito. Mas não em comercial de margarina. Não em perfeição. Não em felizes para sempre. Não no amor romântico. Acho que quando a gente busca incessantemente esse amor romântico, fatalmente acaba exaurido, decepcionado e desiludido.

Meus pais se separaram quando eu ainda era muito pequena. Pequena o suficiente para achar que os pais, ah, os pais deveriam viver juntos para sempre. Sofri na ausência de um ou de outro nas apresentações da escola.

Chorei quando precisei escolher estar com um, ou com o outro. Um dia, no dilema dessa escolha, perguntei ao meu pai por que ele não voltava com a minha mãe (já que obviamente eu notava que existia amor entre eles). Ele me olhou ternamente e me disse: “Filha, nem tudo é como a gente quer. Tem coisas que mesmo que a gente queira, não podem ser mais.”

Como é? Eu pensei. Para mim a fórmula era muito simples. Um gostava do outro, então que passassem por cima de qualquer coisa e ficassem juntos. Pronto. Todos os problemas do mundo (do meu pequeno mundo) estariam resolvidos. Mas minha fórmula nunca aconteceu. Até hoje, pelo menos. A vida continuou e os muitos anos criaram um hiato entre meus pais.

Tenho sérias dúvidas se a mesma lacuna surgiu no amor entre eles. Mas no relacionamento, ela me parece intransponível.

Esses mesmos ‘muitos anos’ me trouxeram lições valiosas, vividas na minha própria vida. Um dia, pelo caminho, pude compreender plenamente as palavras do meu pai dizendo que “nem tudo é como a gente quer. Tem coisas que mesmo que a gente queira, não podem ser mais.” Puxa, como compreendi! Nunca disse para ele como compreendi tão intensamente o olhar terno de quem estava separado de uma história não por vontade, mas porque algumas histórias são assim, tem fim, a despeito da nossa vontade. Não o amor. Esse, quando existe, não acaba, apenas se modifica. As histórias, no entanto, nem sempre podem continuar.

Assim, tornei-me descrente do amor romântico. Conclui, para mim, que um relacionamento sólido e duradouro precisa de uma turma de sentimentos muito mais difíceis de cultivar do que o amor. E que se eles não existirem, não há amor no mundo, que sozinho, seja capaz de sustentar uma relação. Nenhum deles envolve romantismo. O romantismo acaba depois da conquista.

Não existe romantismo na doença, na casa desarrumada, no bafo na boca ao acordar, no banho rápido da rotina, na faxina, no cabelo desgrenhado, no mal humor, no cansaço, na TPM, no desemprego, na falta de dinheiro e conforto, na intimidade esporádica, na conversa ao travesseiro planejando como pagar as contas ou resolver problemas.

Existe amizade, cumplicidade, compreensão, carinho, empatia. E amor. Tudo isso junto, consiste em um relacionamento que dure. Mas só amor, não.

O romantismo cede lugar para a maturidade. Você troca buquê de flores pelo material escolar das crianças, pelo liquidificador novo. Você abre mão da roupa nova pela prestação da casa que conseguiram juntos. Você faz concessões no romantismo do começo pela certeza da continuidade. Substitui os beijos longos dos apaixonados pelos curtos que nada mais querem dizer do que “estou logo ali e vou sempre estar”.

Troca as declarações longas de amor, que querem desesperadamente dizer que você nunca quer perder a outra pessoa, por um breve e sincero “te amo” que quer dizer “te amo”. Na saúde e na doença. Na alegria e na tristeza. Na riqueza e na pobreza. Mesmo que a morte nos separe.

Se for amor, não acaba. Mas se for SÓ amor, não sustenta. Mesmo que dure para sempre. Porque amar, só, não basta.








Sou mãe de um casal (lindo!), 35 anos, formada em Gestão Empresarial, gerencio uma Clínica Médica e escrevo por hobby e amor. Leonina de coração eternamente apaixonado, gosto de manter uma visão romântica sobre a vida. Humana, sou uma montanha russa de sentimentos e quando as palavras me sobram, escrevo. Minha alma deseja profundamente, um dia, apenas escrever